O museu está situado no bairro Gótico, uma zona histórica da cidade, onde há diversos prédios antigos e construções do século XIX, logo, se trata de uma região da cidade é preservada quase sem alterações por questões de manutenção do patrimônio histórico.

Digo isso por duas razões, por ter a ver com a exposição que fui visitar, e para explicar que nessa zona da cidade a acessibilidade se torna um tanto mais complicada que nos demais bairros remodelados para as olimpíadas de 1992, e já dotados de normas de acessibilidade, o que outrora não ocorria.

Existem duas linhas de metrô que levam até lá (Linha 1 e 2) e, algumas de ônibus que deixam relativamente perto do museu, contudo, é necessário andar por ruas estreitas e sem muitas indicações visíveis de localização. Nada que seja inviável ou perigoso caso a pessoa com deficiência visual resolva ir sozinha.

Sempre em meus relatos faço questão de apontar as dificuldades ou não de uma pessoa com deficiência chegar aos locais sozinhas, pois ela deve ter a autonomia de fazer isso com segurança e tranquilidade para se considerar o lugar plenamente acessível. Mas, em todas as minhas visitas vou acompanhado de minha esposa Patrícia, que me auxilia a encontrar o caminho, faz todas as fotografias e outras tantas atividades de assessoramento sem as quais essa pesquisa não seria possível.

Quando se chega ao MACBA, logo é notamos algumas rampas de acesso e que as portas são amplas, permitindo a entrada das cadeiras de rodas e de pessoas com mobilidade reduzida de uma maneira mais fácil. Os espaços são amplos também, sem muitos obstáculos, o que ajuda na mobilidade de pessoas com deficiência visual a não se chocarem contra objetos perigosos. Porém, a sinalização não tem letras grandes e encontrar a recepção sozinho não seria das tarefas mais fáceis.

Ainda nas observações sobre a acessibilidade para pessoas com deficiência física e mobilidade reduzida, foi possível verificar a existência de três elevadores em diferentes pontos, facilitando os deslocamentos entre as três plantas do prédio. Os elevadores me pareceram pequenos e creio que apenas uma pessoa com cadeira de rodas entraria nele por vez, além de não haver sinalização sonora ou em braile.

Em todas as salas de exposição existiam bancos para que as pessoas pudessem sentar e contemplar as obras, bem como, para auxiliar alguém com mobilidade reduzida que necessite descansar por alguns momentos e desfrutar do conforto adequado para percorrer todas as salas sem dificuldades maiores.

No que diz respeito aos recursos de acessibilidade para além dos arquitetônicos, o lugar oferece visitas guiadas específicas em línguas de sinais e para pessoas com deficiência visual. Elas ocorrem em dias e horários bem específicos o que talvez não possa ser considerado algo plenamente inclusivo, na medida em que de alguma forma segrega e aparta esses grupos da convivência com os demais.

Diante das políticas de isenções de ingressos, as pessoas comprovadamente com deficiência (ainda que seja um conceito um tanto abstrato) não pagam ingresso e tem direito a levar um acompanhante. Como já disse outras vezes, quando um lugar não tem acessibilidade plena franquia ou oferece descontos para pessoas com deficiência como uma espécie de “troca” ou “pedido de desculpas” diante da falta de acessibilidade.

No caso do MACBA, não posso dizer que foi exatamente assim, pois embora alguns pequenos problemas, como a não existência de piso podotátil, no mais o lugar é plenamente acessível, e se a pessoa fizer a visita guiada para pessoas com deficiência visual, também terá pleno acesso ao acervo das exposições que lá estão. Logo, julgo que nesse quesito seja um dos mais completos ambientes culturais de Barcelona.

Experimentei a visita guiada oferecida para pessoas com deficiência visual que ocorrem aos sábados, sempre às 12 horas no idioma espanhol, já que às 13 horas é realizada em catalão. Viver uma realidade bilíngue como é o caso de Barcelona, em que as referidas línguas são usadas a todo momento, proporciona que em muitos dos espaços culturais da cidade exista essa diferenciação entre as visitas guiadas, onde via de regra, as realizadas em espanhol tem em sua maioria turistas de outros países ou regiões da Espanha que não a Catalunha.

Já as visitas em Catalão, na maioria das vezes são assistidas por habitantes de Barcelona e outras cidades da Catalunha, onde valorizam seu idioma como primeira língua. Há também aqueles que aproveitam para aprender um pouco de catalão nessas ocasiões, como eu mesmo já fiz algumas vezes. Dessa vez, optei pela visita em espanhol, pois a compreensão das explicações sobre conceitos da arte contemporânea são muitas vezes de difícil compreensão parara muitas pessoas, inclusive para mim.

Além disso, a guia nos disse que nessa visita específica para pessoas cegas e com baixa visão, eram feitas audiodescrições de algumas obras, o que é muito interessante para meu aprendizado nesse campo. Assim, sendo eu o único visitante com deficiência naquele dia, tive uma visita guiada com audiodescrição feita individualmente e de modo personalizado.

O museu não tem um grande acervo permanente, e as exposições são sempre temporárias, assim, podem variar de acordo com a época em que a visita for feita. Mesmo assim, todas elas contam com reproduções que podem ser tocadas e audiodescrição daquelas obras consideradas mais relevantes em cada exposição. Portanto, as obras táteis, os audioguias com audiodescrição, e as visitas guiadas feitas igualmente com AD, também variam em seu conteúdo, ainda que a forma e o conceito utilizados seja os mesmos.

Desse modo, visitei a exposição chamada Arte, do puntos (arte, dois pontos), que retrata as mudanças urbanísticas e sociais de Barcelona ao longo do final do século XIX até os dias atuais. Cada artista apresenta sua diferente perspectiva sobre como e que implicações tem essas transformações. Desde a modificação arquitetônica dos prédios como a construção de edifícios modernos com linhas mais curvas e formatos diferentes dos retangulares e em arco como os anteriores.

Tudo isso, passando pelo alargamento das ruas, revitalização de praças e parques da cidade, bem como da zona portuária e a transformação da orla em uma região de turismo e lazer. Sendo que as implicações disso foram a migração das populações mais pobres que residiam nessas áreas consideradas degradadas, indo para as periferias da cidade. Bem como, a modificação da relação dos habitantes com a cidade diante disso tudo. Muitos artistas com obras nessas exposições buscam inclusive retratar como Barcelona se transformou mais em uma cidade turística do que voltada para seus habitantes e suas tradições. A ocupação e a relação do barcelonês com os espaços urbanos não foi mais a mesma depois desse processo, conforme pude verificar na exposição.

Por outro lado, essa crítica ao novo modelo urbanístico está mesclada com a demonstração de como o espaço urbano pode ser usado como uma reivindicação política e como a arte pode fazer pensar sobre essas relações. Muitas obras são do período ditatorial vivido na Espanha até inicio dos anos 1980, fazendo com que a arte fosse uma das formas de resistência em favor da democracia.

Da mesma forma, questiona uma série de valores, introduz novas cores e técnicas artísticas dentro das mais diferentes correntes artísticas que se sucederam nesses anos todos. Isso oferece um rico e inesquecível aprendizado para os visitantes. Mas, será que se não houvesse audiodescrição eu saberia de tudo isso? Certamente que não.

Não teria condições de ter esses conhecimentos não fosse a minuciosa e qualificada audiodescrição feita pela guia do museu que foi comigo a todos os espaços e os descreveu por inteiro, dando uma ideia geral sobre como era cada sala e o que nela estava contida.

Logo em seguida, fazia a descrição detalhada de duas ou três obras em cada uma das salas. Geralmente, as que entendem mais representativas e que ajudam no entendimento das demais, pois ao todo são mais de 4 mil imagens, e descrever todas é impossível, do mesmo modo que ver a todas também o é.

As descrições continham muitos detalhes sobre as cores, formas e texturas das obras. Além disso, o vocabulário utilizado era simples, facilitando a compreensão e a formação das imagens por parte daqueles que não estão vendo nada ou apenas parte do que estava exposto.

Como disse antes, algumas obras foram reproduzidas para ser tocadas por aqueles que desejarem. Mais precisamente nessa exposição, são dez obras que podem ser tocadas por pessoas com ou sem deficiência. Contudo oito dessas peças são apenas reproduções de partes e não são cópias completas. Ou seja, objetos de um metro de altura por quarenta centímetros de largura que representavam as partes consideradas mais importantes e relevantes de cada peça para ser tocada.

Ao lado de cada uma dessas reproduções, na parte superior havia uma impressão feita em alto relevo da obra completa em tamanho menor (cerca de vinte centímetros de altura por vinte de altura), com o objetivo de ser tocada pelo usuário, de maneira que pudesse ter acesso às formas e proporções da obra completa. Abaixo dela, outra folha com dados sobre a peça original, com nome, data a autor. E ao lado, as mesmas informações estão disponíveis em braile.

Enfim, posso dizer que a visita ao MACBA foi excelente em termos de aprendizagem sobre o modelo de acessibilidade usado por essa instituição cultural. Até porque, a arte contemporânea tem muitos elementos artísticos, qe a AD nesses locais agrega muitíssimo para a compreensão dessas obras por pessoas com deficiência visual.

Considero que a acessibilidade nesse museu é especialmente bem qualificada e permite o entendimento sobre as obras e seus contextos. Isso demonstra as grandes possibilidades existentes quando se alia arte e acessibilidade, e que ainda temos muito a aprender sobre como implantar audiodescrição em nossos museus, e promover o entendimento de que acessibilidade deve ser sempre prioridade.

Fonte: Arte, Cultura e Deficiência Visual

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